Quando eu era criança, amava assistir O Estranho Mundo de Jack. Ele era um desses filmes que me causavam conforto, na época, eu não sabia bem dizer o que me atraia tanto. Também não sentia nenhum medo daqueles monstros ou do cemitério, inclusive, cemitério é um dos locais mais legais para visitar, pelo menos para mim! Lá no fundo, eu gosto de coisas que são consideradas “esquisitas”, embora eu não demonstre tanto assim (acho).
Recentemente assiti de novo porque eu acabei me lembrando dessa época. Dessa vez eu percebi uma porção de coisas que não havia me dado conta quando criança, afinal, eu aprendi tantas coisas ao longo desses anos, como por exemplo, a peça de teatro Hamlet! Logo mais vou falar o motivo de ter citado este clássico.
O início do filme mostra o Jack recebendo muitos elogios por mais uma vez ter transformado o dia do Halloween em um horror, é um momento de glória! Para a população não há nada mais incrível e mal imaginam o dilema que se passa no âmago de seu grande ídolo. Ao longo da cena, Jack vai se afastando da cidade e expressando o vazio que sente porque tudo é igual todas as vezes. Ele anseia por algo superior.
Então ele descobre um lugar com várias portas, e cada uma levava para algum feriado importante em específico. Ele decide abrir a porta do Natal e se impressiona com um mundo completamente diferente. Há cores, alegria, doces e presentes. Jack não entende nada disso e resolve tentar descobrir do que se trata!
Esse é um momento que considero bastante interessante. A personagem resolve entender o Natal através dos livros, dos contos que se passam nessa época. Há referência a Rudolph (Robert L. May) e a Um Cântico de Natal (Charles Dickens), mas ele ainda não consegue compreender a razão do Natal. Sua última tentativa é ler um livro do método científico e iniciar as experiências. Por exemplo, ele corta a barriga de um ursinho de pelúcia e surge muita espuma. E nesta série de pesquisas práticas, ele continua sem entender o significado do Natal.
O que eu pensei ao assistir essas cenas foi que o Natal tem um significado para além dos livros, da ciência, do material… E o método científico não tem como medir algo que possui uma natureza diferente daquilo que estava sendo pesquisado. Além disso, o Jack é um esqueleto, ele vive no mundo dos mortos, das assombrações, um lugar sem vida. Seria exigir muito porque está além de sua capacidade. Ele realmente continua todo o filme sem entender o Natal. Porém, ele acaba percebendo o valor que existe em seu mundo e se arrepende de todos os erros cometidos nessa busca maluca de preencher o vazio.
O desenho também toca em um assunto muito interessante: o drama existencial. O Rei da Abóbora anseia por algo maior, sem saber exatamente o que seria isso. Ele é um idealista nato, há nele uma esperança de que existe algo muito maior do que assustar criancinhas. Ele me lembra um pouco Hamlet, como escrevi no início, por causa desse desejo. Desse questionamento e desse caminho para dentro de si mesmo. Essas perguntas sobre a nobreza da alma e o desgosto de uma vida, aparentemente, sem sentido que há em Hamlet, há também um pouco na história do Jack.
Então o Jack sonha nesse mundo de medo e morte. Não somente ele, mas também a Sally, uma personagem fundamental na trama. Ela também é sonhadora, mas a considero muito mais sensata que o seu par romântico, porque desde o começo ela nota que o que o Sr. Esqueleto quer fazer é algo que vai acabar muito mal. Ela age de maneira semelhante a Ofélia alertando o Hamlet de suas loucuras. Para mim, a Sally é a responsável por salvar o Natal. O que a tornou heroína da história foi o fato dela não buscar agir de modo diferente do que ela é. Há nela muitos atributos da feminilidade: doçura, discrição, paciência e compaixão. Todas estas qualidades em ação trouxeram um final feliz para o filme.
Obrigada pela visita. ♡