A amizade de Charlotte

A Teia de Charlotte é uma literatura infantil escrita pelo autor Elwyn Brooks White. Esta leitura é bastante simples, mas não significa que não há uma grande profundidade na narrativa. Resolvi adquirir uma edição no original para ter mais contato com este idioma estrangeiro e por se tratar de um livro que já conhecia a história não tive dificuldades em lê-lo.

O livro narra a história de um porquinho chamado Wilbur, ele é o mais frágil e pequenino da ninhada. Por este motivo, o dono da fazenda, pai da garotinha Fern, decide sacrificá-lo. Fern ao saber disso, não mede esforços para salvar a vida de Wilbur. A menina argumenta que ela também nasceu pequenina e frágil e por isto, o porquinho também mercecia viver. O pai diz que há uma diferença enorme entre uma garotinha e um porco. É a partir deste momento que tentarei expressar algumas reflexões que surgiram em minha mente durante a leitura desta cena. Concordo com o pai da Fern, pois um ser humano possui muito mais dignidade que um animal, mas isto não significa que temos um “passe-livre” para maltratá-los sem nenhum motivo justo, por exemplo, a alimentação.

Fern promete ao pai que irá cuidar do porquinho, o nomeia de Wilbur e então o senhor pai permite que a menina cuide dele. O tempo passa e Wilbur fica grande demais para ser mantido dentro de uma casa. O pai da Fern decide vendê-lo aos tios da garota. Wilbur então é transportado para a fazenda e lá conhece a gansa, os carneiros, o rato Templeton e a aranha Charlotte! Nos primeiros momentos, Wilbur não consegue se adaptar muito bem, pois ele ansiava por um amigo para brincar, e nenhum animal que havia lá poderia ou não queria oferecer isto. Até que uma voz desconhecida lhe diz que será sua amiga. O porquinho fica extremamente feliz, mas não consegue ver a dona daquela voz. Charlotte lhe diz para ir dormir que no dia seguinte ele iria vê-la. Deste momento em diante é construído (ou tecido) uma linda amizade.

Neste momento fiquei refletindo que, geralmente, as crianças são ótimas fazedoras de amigos. Pelo menos algumas são porque quando eu era criança (e até hoje) não conseguia me ligar muito fácil aos outros que me eram estranhos. Entretanto, uma vez que eu esteja ligada espiritualmente a alguém, é um laço pelo qual eu me esforço para manter. O que me remete a pensar sobre a simplicidade e quando agimos de tal maneira, é gerado um efeito muito simples também. A Charlotte disse ao Wilbur que seria sua amiga da maneira mais prática. Não houve grandes complicações ou algum critério. Ela somente ofereceu a sua amizade.

Algo que notei e considero muito lindo nesta amizade é que a Charlotte foi dando mais sagacidade ao Wilbur. O porquinho é muito ingênuo sobre como realmente a vida é. Quando uma mosca cai na teia da aranha e a mesma suga o sangue deste inseto (o sangue dos insetos é chamado de hemolinfa), o Wilbur acha uma tremenda crueldade, e sua amiga lhe explica que isto é o seu café da manhã, e então Wilbur lhe pede para que não lhe conte mais todas estas crueldades. E a Charlotte replica: “mas é a verdade e eu tenho que dizê-la.” Ela tenta mostrar ao porquinho como são as coisas e que por mais duras que possam parecer, a verdade não deve ser negligenciada só para satisfazer os sentimentos de alguém.

Isto lembra-me a definição de amizade de Aristóteles, que foi descrita em três categorias distintas: 01) a amizade baseada na utilidade ou interesse, 02) a amizade baseada no prazer, e 03) a amizade baseada na virtude. Neste primeiro diálogo entre estas duas personagens já dá para perceber que a Charlotte não faz parte de modo algum do tipo 02, porque ela disse a verdade. Ela preferiu “correr o risco” de provevelmente o Wilbur não simpatizar muito com ela, do que se manter no prazer de ser bem vista ou aceita por parte do outro, ou quem quer que seja. Mas vale ressaltar, que ela expressou a verdade de uma maneira simples e caridosa.

O verão chega e conhecemos mais a fundo uma outra personagem que merece ganhar a atenção do leitor, o rato Templeton. Ele é uma criatura que está apenas interessada em seus próprios assuntos. Ele só pensa em comida e em espiar, ele se une aos outros animais da fazenda somente se ele percebe que obterá algum tipo de vantagem. Claramente o Templeton faz parte da categoria 01 que o Aristóteles disse, a amizade interesseira, esta é baseada completamente no egoísmo.

Ainda durante o verão, o Wilbur descobre que está sendo mantido ali porque os donos da fazenda pretendem comê-lo no Natal. O porquinho fica desesperado, ele chora porque quer conhecer a neve! Então a sua amiga Charlotte lhe promete que irá tentar salvar a sua vida, ainda sem saber como, mas garante que não medirá esforços para alcançar tal objetivo. Então ela passa vários dias pensando, a mesma diz que prefere ficar sozinha porque ela pensa melhor quando está sozinha… Até que em uma manhã ocorre um milagre, há algo escrito na teia de Charlotte: “Some Pig”. Algo que pode ser em português como “um porco e tanto” ou “que porco!”. O fenômeno chamou atenção da cidade inteira. Mesmo a Charlotte sendo tão pequenina e sem a menor chance de encontrar uma solução através da força, utilizou sua inteligência para o bem de seu querido amigo.

Somente este evento não foi o suficiente para que os fazendeiros desistissem de matar Wilbur, a frase acabou não sendo interpretada como a Charlotte esperava, pois ficou parecendo que “um porco e tanto” corroborou ainda mais para ele se tornar um bacon. A amiga aranha não desistiu e continuou trabalhando e pensando no que poderia escrever em sua teia. Ela resolve pedir a ajuda de Templeton, e este, como é de se esperar, só concordou em ajudar porque recebeu algumas recompensas, como o ovo da gansa que não saiu nenhum gansinho.

Eis que a época da grande Feira da cidade vem chegando e Wilbur consegue o destaque de concorrer com outros porcos por causa das famosas palavras sobre ele na teia. A Charlotte neste momento está passando por uma situação delicada, assim pode-se dizer. Ela reluta um pouco se vai com o seu amigo ou não, e penso que é a partir deste momento que é saltado aos olhos o valor de uma amizade verdadeira. A Charlotte está o tempo todo pensando no bem estar do outro e isto é uma aprova de sua fidelidade para com o Wilbur. Aqui gostaria de mencionar que esta personagem é um exemplo do que Aristóteles disse sobre o tipo 03 de amizade: aquela baseada na virtude. E quais são as virtudes que eu consigo observar na Charlotte? Caridade, paciência, abnegação, magnanimidade, perseverança e um grande espírito de sacrifício. A Charlotte acompanha o seu amigo, pois sabe que ainda há muito o que fazer, as outras palavras ainda não foram o suficiente para salvar a vida do porquinho. Até que ela encontra a palavra perfeita: Humilde.

Uma das cenas mais belas e que eu chorei ao ler (e também quando assisto ao filme), é quando o Wilbur pergunta a Charlotte: Por que você fez tudo isso por mim? E a aranha responde: Você tem sido o meu amigo, e isso em si é uma coisa tremenda. A Charlotte é muito maravilhosa! Acredito que esta pequena passagem da história consegue resumir o que motivou a Charlotte ser tão abnegada de si mesma.

Obrigada pela visita. ♡

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