A minha primeira leitura de A Divina Comédia

Concluí a minha primeira leitura de A Divina Comédia e ela se deu no início da primavera (aqui no hemisfério sul foi o outono), tal como o Dante que iniciou a sua jornada em busca pela Verdade na primavera também! Se eu tivesse combinado, não teria dado tão certo essa coincidência. Esse detalhe sobre a primavera me chamou a atenção porque segundo alguns cálculos medievais, 18 de março foi a data do primeiro dia da Criação! Isso é só um grão de areia diante da praia da cosmovisão de outrora, mas que infelizmente não é tão falada porque atualmente tudo isso é visto como superstição e coisas do tipo. Bem, eu devo o interesse por essa leitura ao físico Wolfgang Smith porque foi por eu ter lido o seu livro, A Sabedoria da Antiga Cosmologia, que decedi ler imediatamente A Divina Comédia. Que Deus o tenha!

No Inferno nem preciso dizer que foi um inferno ter lido (desculpa o trocadilho kkk). Mas é que nessa parte só tem desgraça, castigo, murmúrio etc. Por falar em murmúrio, no Canto III, há versos sobre almas que blasfemavam a si mesmas murmurando sobre o dia e/ou lugar que nasceu, isso me chamou muito a atenção! Um dos Cantos que mais me deixaram em choque foi o XXXIII que narra a história do conde Ugolino que foi traído pelo arcebispo Ruggieri, foi por ele detido, junto com seus filhos e dois netos, trancado em uma cela até morrerem de fome. Ler sobre um pai que vê sua família morrer lentamente e sem poder fazer nada me doeu muito.

No Purgatório as coisas começam a melhorar porque as almas, apesar de sofrerem, elas ao mesmo tempo, sentem a esperança do dia que sairão dali para adentrarem no Paraíso. Elas também acham justo a sua purificação e sempre pedem ao Dante, que ao regressar, falem com seus parentes para que rezem por eles. No final do Purgatório, chorei muito porque é quando o Virgílio se despede do Dante e não vai mais guiá-lo, também fiquei rindo ao mesmo tempo que chorava porque eu não estava acreditando que um livro estava fazendo isso comigo. O meu marido olhava para mim e não entendia nada kkkk.

Por fim, o Paraíso!! Essa foi a parte que eu mais estava ansiosa para ler porque sabia de antemão que ela é a que mais têm referências ao simbolismo astrológico. Simplesmente fiquei feliz ao ler cada verso e também por ter conseguido compreender o porquê de cada alma beata estar em determinado planeta. Acredito que isso aconteceu porque já tem algum tempo que tento aprender sobre o simbolismo da astrologia tradicional, e mesmo eu não sendo nenhuma especialista, deu para ter uma boa compreensão do texto. Com a graça de Deus, pretendo me aprofundar cada vez mais nesse assunto.

Preciso comentar um outro ponto que me chamou a atenção. No final do Paraíso (Canto XXIX) nos é apresentado a respeito do céu material, e este é animado pelas Inteligências Angélicas, os anjos fiéis a Deus. Quando Beatriz discursa sobre quais são as faculdades destas criaturas, ela diz que São Jerônimo escreveu sobre os anjos terem sido criados séculos antes de o mundo ter sido feito, e incentiva o Dante a procurar isso nas Sagradas Escrituras. Ah, esse assunto coincidiu com uma outra leitura que fiz nesse ano, a Trilogia Cósmica do C. S. Lewis!

Algumas coisas que me fizeram rir [uma nota para quem diz que A Divina Comédia não é uma comédia (outro trocadilho absurdo, desculpa, eu não me contenho kkkk)]: O Dante se colocando no clube dos maiores poetas do mundo; O modo como o Virgílio dava bronca ou conselhos para o Dante; o Dante fazendo um elogio para o signo de Gêmeos porque foi sob este signo que ele nasceu; o Dante parecendo a personificação daquela música do Cazuza (Exagerado) quando se tratava da Beatriz; a Beatriz ensinando sobre cosmologia ao Dante; e o fato de que o Dante fez um “exposed” de várias pessoas, inclusive de Papas.

Enfim, eu gostei muito de ter lido A Divina Comédia, apesar de ter me arrastado por tanto tempo nesse livro, ele se tornou um dos meus livros favoritos e se Deus quiser, pretendo sempre relê-lo! Acredito que com o tempo, terei mais bagagem para compreender a obra profundamente. Ficou muito nítido o quanto Dante Alighieri é um escritor genial, portanto, ele merece estar no clube dos grandes poetas.

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Céu da Lua – A Divina Comédia

Olá! Estou sentindo vontade de compartilhar o que observei durante a leitura do Paraíso na Divina Comédia. Estas observações são singelas e baseadas no pouco de conhecimento que aprendi, até o momento, sobre o simbolismo astrológico. Tentarei fazer uma publicação para cada planeta e espero que isso ajude de algum modo aos leitores deste clássico. Segue o meu texto:

Chegamos ao Canto do Paraíso da concha concêntrica da Lua! Mas antes de tecer qualquer comentário sobre o Canto III, gostaria de falar um pouco sobre o simbolismo da Lua na astrologia e em seguida sobre o que é narrado.

Bem, a Lua é um planeta de fases, portanto ela nos fala sobre a mutabilidade ou inconstância. Ela também nos fala sobre os nossos sentimentos mais íntimos, o que nos faz feliz profundamente, sobre o que precisamos para nos sentirmos seguros.

Neste canto conhecemos a alma de Piccarda, então o Dante lhe questiona se ela não se sente infeliz por estar no lugar mais distante de Deus e se gostaria de estar em um lugar superior. Ela responde que este sentimento é impossível no Paraíso, porque a felicidade dos beatos da Lua reside justamente em cumprir a vontade de Deus, e isso lhe dá o sentimento de paz.

Durante a sua vida na terra, Piccarda fez votos ainda adolescente, mas o seu irmão a obrigou a se casar com um nobre. Apesar desse infortúnio, Piccarda manteve em seu coração os votos que fizera.

Percebemos que o tema central neste Canto são os sentimentos e aquilo que levamos no mais âmago de nosso ser, a nossa vontade mais profunda… Como o exemplo de Piccarda que conservou em seu coração a sua promessa, a sua vontade mais profunda, aquilo que estava escondido e só ela e Deus sabiam.

Também percebemos uma alusão mitológica da deusa Diana. Dante explora a concepção tradicional da Lua como planeta de Diana, a deusa virgem e protetora das mulheres.

Interessante observar também que neste Canto são nos mostrados apenas mulheres, a Lua é um planeta feminino, de qualidade úmida e fria.

Acredito que a alma beata de Piccarda nos faz refletir sobre o quanto nosso interior é importante, apesar do que ocorre externamente. O seu coração se manteve fincado em seus votos como a Cruz fincada no Monte Gólgota, mesmo tendo sido obrigada a viver um casamento infeliz. Deus é o nosso Pai bondoso que se importa com nossos sentimentos mais profundos e as circunstâncias a qual estamos inseridos, conhece plenamente o nosso coração e não desprezou Piccarda por ela ter tido que quebrar o seus votos, pois em seu coração ela foi fiel.

A Lua nos diz sobre a inconstância dos sentimentos, mas no coração humano há uma força superior.

 

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Jornal Literário: Livro de Gênesis

Finalmente consegui fazer um resuminho para o Livro de Gênesis! Eu senti muita dificuldade pelo fato de ser um baita livro, exigi de mim mesma muita responsabilidade, não que nos outros eu não fizesse o mesmo… Enfim, acredito que deu para mencionar os principais pontos e também o que despertou mais a minha atenção.

No final do ano passado resolvi fazer jornais literários porque eles unem minhas paixões: estudo, literatura e pintura. Por aqui, já postei sobre Bambi (Felix Salten) e Memórias do Subsolo (Fiódor Dostoiévski). O objetivo é fazer para todas as minhas leituras enquanto houver papel nesse caderno. Acredito que é um boa maneira de meditar sobre minhas leituras, de amadurecer na alma tudo aquilo que ingeri ao ler. E por que não adicionar algumas ilustrações? Tenho pintado com láspis de cor, caneta preta comum e recentemente acrescentei canetinhas de pintura.

Escolhi a minha frase favorita que é sobre o céu, tudo o que há nele e o propósito desta criação em específico. Acho que dá para notar que quando Deus vai criando cada coisa, Ele dá uma vocação para ela, certo? Os luzeiros do céu tem o objetivo de separar o dia e a noite, servem de sinais e marcam o tempo. Simplesmente amo o céu!

A mão colhendo a maçã é meramente ilustrativo, pois eu não sei qual fruto era e também é pelo fato de ser algo que está muito no imaginário das pessoas.

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Memórias do Subsolo – Fiódor Dostoiévski

“Aproximemo-nos, pois, de coração sincero, cheios de fé, com o coração purificado da má consciência e o corpo lavado com água pura.”
― Hebreus, 10,22

Minha leitura mais recente (e que leitura!) foi Memórias do Subsolo. Aqui eu disse que foi um livro que mexeu muito com a minha alma, e eu acredito que isso acontece com todos os que se aventuram pelo subsolo, guiados por um personagem misterioso.

A personagem principal também é o narrador da história, portanto, todos os acontecimentos relatados são do ponto de vista do Homem do subsolo, e isso significa que talvez ele imaginou e exagerou coisas sobre os acontecimentos, ou não… O romance é uma espécie de diário composto por anotações onde descreve sobre a sua vida e sobre os seus pensamentos. Por se tratar de um diário, a personagem sente-se livre e à vontade para escrever o que há de mais profundo em seu íntimo, então o narrador revela suas falhas, contradições e reflexões. Pois bem, estas reflexões são dotadas de uma grande sensibilidade, ouso nomear desta maneira porque me refiro a sensibilidade em alcançar o cerne de sua própria alma.

É de impressionar, a nós leitores, o quanto ele compreendia sobre o que a perversidade pode causar em um ser humano. Ele é um homem amargurado, que se ofende por qualquer banalidade, se ofende ao ponto de desejar levar a ofensa até as últimas consequências e, ao mesmo tempo, ele se envergonha de não conseguir alcançar essas últimas consequências, de não ser capaz de ser um inseto (como o próprio se auto refere). Seu íntimo está mergulhado nas ideias vigentes da época, o niilismo, o romantismo, o racionalismo e o existencialismo. Vamos por parte, inicio pelo existencialismo.

O existencialismo é uma filosofia que afirma que os humanos devem procurar encontrar significado, identidade e moralidade em um universo sem sentido e incompreensível. A pessoa existencial luta para compreender quem ela é e como essa identidade se encaixa em um universo incognoscível.

O racionalismo estava na moda também na Rússia durante o século XIX, esta filosofia fundamentava que o homem é inatamente bom, portanto, se ele agir racionalmente e pensando nos seus próprios interesses, o mundo se tornaria perfeito. Na Rússia, o principal porta-voz desta filosofia foi Nikolay Chernyshevsky, que popularizou as suas ideias no seu livro de 1863, What Is to Be Done? E o Memórias do Subsolo é também uma resposta para este livro. Dostoiévski, por ser um ortodoxo convicto, não acreditava nesta filosofia. Os santos do Oriente viam o pecado original como uma consequência da desobediência de Adão, e apesar de ter deixado uma mácula em seus descendentes, não era ao ponto de apagar a centelha de bondade pois o homem foi criado a imagem de Deus. Então, quando o homem trabalha pela bonda, a graça divina o ajuda. Bem, não vou me delongar tanto nesse assunto, mas eu acho importante ter uma noção a respeito, pois para entender o texto, tenho que entender o autor…

O romantismo também foi criticado pelo autor. Esta corrente se oponha ao iluminismo, ao progresso científico. Os românticos rejeitavam absolutamente o racionalismo e abraçavam completamente o instinto, o sentimento, a natureza. Há um tempo escrevi um pouquinho sobre Anna Kariênina e as influências de Tolstói que inspiraram o romance, por algum motivo, acredito que se encaixa nesse assunto porque em Walden (Henry David Thoreau) há bastante exaltação pela natureza, algo bem romântico.

Por fim, o niilismo, o grande alvo! Para a ortodoxia, o combate contra o demônio é algo contínuo e o intelecto está “despedaçado” pelo mal (por causa da ação demoníaca sobre a alma), causando dificuldade em se concentrar, então o ser humano precisa se concentrar em algo para conseguir se distanciar da decomposição do intelecto. Então para o Dostoiévski, os ateus não percebem que a morte (do corpo) não é a principal forma de decomposição do homem. Esta é a essência do niilismo. Então, é como se o autor estivesse colocando um espelho diante de um niilista para fazê-lo ver o que esta ideia é capaz de causar na alma se a pessoa quiser levar esta filosofia adiante, de realmente pô-la em prática.

A influência religiosa é muito nítida em todos os livros do Dostoiévski que são considerados de sua fase madura. Os seus personagens são caracterizados com uma elevada consciência de si mesmos e tal fato os destroem, inevitavelmente, porque eles se recusam a suportar o tormento de viver uma vida sem esperança e tornam-se como insetos vivendo no escuro do subsolo. Mas alguns encontram a luz da vela.

Eu decidi desenhar uma vela no escuro e mariposas ao redor porque a consciência de si mesmo é uma graça divina, o fogo é também símbolo do divino (o fogo sempre se ergue para o alto, purifica objetos, cauteriza etc) e as mariposas são símbolo do pecado. Acredito que, simbolicamente, consegue resumir a novela

O pobre homem do subsolo me fez imaginar que este subsolo onde se encontra é um lugar escuro, e o escuro desvanece a visão. Mas um lugar escuro precisa de luz para que se possa ver o que há no ambiente, então usamos uma vela e o fogo para iluminar. Este fogo é sempre sublime, pois se levanta para o alto… O pobre homem do subsolo fechou em si mesmo e não pôde olhar para o fogo da vela se erguendo para o céu.

Obrigada pela visita. ♡

Sebo da Mimi

“Happiness is a warm puppy.”
― Charles M. Schulz

Adquiri dois livrinhos da coleção do Peanuts graças a uma amiga que iniciou um sebo online. O endereço online é este aqui para alguém que, assim como eu, ama visitar sebos presencialmente ou online e garimpar algo com um preço camarada.

Vou deixar uma parte da apresentação do sebo (eu achei uma fofura). Realmente, as bibliotecas são espaços mágicos, eu amo o ar que elas difundem e muitas vezes elas são o único acesso que uma pessoa pode ter a literatura. Quanto aos sebos, é uma maneira maravilhosa para começar a sua biblioteca particular. Espero que encontre algo de seu interesse na Mimi’s House.

“(…) Sou uma aspirante a livreira e moro e cresci numa cidade sem livrarias físicas até hoje, meu único acesso sempre foi a biblioteca, está vendo? Mas hoje também sou adepta as livrarias e sebos virtuais da internet, muito benéficos pra quem mora a distância das grandes cidades. Esse espacinho especial aqui é pra você que procura um livrinho usado/seminovo pra começar sua coleção, foi assim que comecei a minha, e era mágico quando cada livro chegava e, pronto: mal feito, feito! ♡ conquistou meu coração e espero que a magia dos livros em seus vários formatos alcance você”.

Obrigada pela visitia. ♡

Bambi – Felix Salten

“Sim, a vida era mesmo difícil e cheia de perigos,
mas viesse o que viesse, ele aprenderia a suportar tudo.”

Regressei a este livro porque a primeira vez que o li senti algo que não consiguia explicar. Embora o conteúdo tenha se desvanecido um pouco em minha memória, a lembrança daquele forte sentimento surgia sempre que eu lembrava de Bambi. Então resolvi reler em busca de recordar o porquê senti-me daquela maneira.

Então concluí a minha releitura e mais uma vez a literatura me faz sentir inclinada a registrar as minhas primeiras impressões, estas que tenho antes de pesquisar a respeito do autor e de sua obra. Recordo do sentimento que se impregnou na minha alma quando o li pela primeira vez, foi como um perfume de alguma flor vespertina que se abriu e eu não soube identificar a sua espécie. Mas neste momento sei exatamente o porquê, e creio que hoje posso balbuciar alguma palavra para descrever: uma experiência espiritual.

Não é espiritual no sentido de ver um fantasma, mas é algo que acontece no fundo do nosso ser, principalmente pelo próprio livro mencionar algo que está para além da natureza, de animais, de carvalhos, esquilos, lagos, raposas e cervos.

A história se inicia com o nascimento do Bambi, durante a primavera. Ele vai crescendo e descobrindo o mundo, descobre que há perigos neste mundo! Entre tanta vida, há também a morte, a mudança do tempo percebida pelas estações… Tudo muda, mas também tudo permanece igual. Os cervos nascem, mas nenhum é igual ao outro. E dentro desse universo há a perseguição que “Ele” faz às demais criaturas

“Ele” é o perigo e o perseguidor. Ele é pálido e sem pelos, possui três braços, e quando está com o terceiro, é sinal de grande risco. Embora pareça que o perigo venha somente de fora da floresta, dentro dela há as suas próprias nocividades. Uma pata deve se manter sempre alerta por causa das raposas; o esquilo igualmente, por causa das corujas. E esse mundo tão austero, aparentemente, é também regido por uma ordem, a lei da natureza. Mas um dia todos viverão em harmonia, um dia “Ele” irá brincar com os cervos e todas as demais criaturas do mundo porque o Criador de todos ressuscitou e renova todas as coisas.

O autor Felix Salten criou esta alegoria antropomórfica de si mesmo sobre a sua fuga para a Suíça na época da Segunda Guerra Mundial. Ele e sua família eram judeus. Inclusive, Hitler censurou o seu livro durante o regime nazista. Após eu ter lido sobre a obra, vi com outros olhos a leitura. Embora a minha primeira impressão não tenha sido de todo tão fora do propósito do autor.

Algumas coisas curiosas que percebi, o Bambi começa a sua vida sendo bastante curioso e entusiasmado por conhecer outros animais e ao longo de seu amadurecimento, ele vai preferindo ficar sozinho, abrindo uma exceção para a companhia do Velho Cervo, uma espécie de sábio da floresta. E é este velho sábio que ensina ao Bambi que o caçador não é maior que tudo e todos, que ele também morre e sente medo como os seus amigos da floresta. Então há Alguém que é maior que “Ele”, e é esse Alguém responsável pela criação de tudo o que existe.

Estava olhando fotos de “journaling” com o tema literatura e desejei fazer o mesmo. Que bom que o meu primeiro jornal literário tenha sido Bambi, pois é um dos meus livros favoritos, embora eu ainda não tenha nenhum exemplar. Ah, também decidi reler neste ano porque a obra está completando cem anos!! A aventura que vivi dentro do mundo do Bambi deixou-me feliz com as belas descrições da natureza, em especial o capítulo poético de duas folhas conversando e o anúncio do inverno. Senti também bastante aflição em alguns momentos e ao mesmo tempo esperança.

Edição II e umas notas aleatórias:

Bem, eu sou muito interessada em animais e eu estou sempre buscando (ou achando “do nada”) sobre algum santo que teve experiências com animais ou ensinou sobre como será a criação após a ressurreição dos corpos… Sei que este último é um assunto tratado pelos primeiros padres da Igreja, e infelizmente eu ainda não encontrei… Vou ter de ler a Patrística toda, pelo visto (risos). Já vi alguém dizer que São Máximo, o Confessor, escreveu a respeito de que Deus renovará todas as coisas, inclusive os animais, vegetais, corpos celestes, enfim, tudo o que Ele criou. E com a leitura deste livro, fiquei ainda mais obcecada em encontrar, mas por enquanto, eu acabei conhecendo umas histórias sobre São Francisco de Paula. Ele também foi alguém bastante interessado por animais e possuía um peixe e um cordeiro de estimação. Estes animais morreram e o santo rezou para Deus pedindo que devolvesse a vida aos seus bichinhos de estimação. E Deus, comovido com a sua humildade, lhe concede esta graça. O peixe se chamava Anatonella e o cordeiro Martinello. Também lembrei de São Francisco de Assis e o lobo selvagem que andava atormentando os moradores de Gubbio. Este santo selou a paz entre as pessoas e o lobo, o que me faz pensar: como os santos nos mostram com sua vida e devoção a Deus de como será na vida vindoura, acredito que a paz seja uma delas, até mesmo a paz entre “caça e caçador”.

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The Bestiary of Christ

Pois nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos ou soberanias, poderes ou autoridades; todas as coisas foram criadas por ele e para ele. Ele é antes de todas as coisas, e nele tudo subsiste. – Colossenses 1:16-17

Devemos nos iniciar nas letras profanas, antes de se empenhar no estudo das coisas sagradas. Primeiro devemos aprender a ver o reflexo do sol nas águas cristalinas e, depois, com a visão fortalecida, olhar diretamente para a luz pura. – Cartas aos jovens sobre a utilidade da literatura pagã, São Basílio.

O Bestiário de Cristo é um livro que nos apresenta um maravilhoso compêndio de simbolismo animal. Bem, acredito que esta frase de São Basílio pode ser usada também para ilustrar a importância de aprendermos os símbolos, principalmente para compreendermos melhor certos mistérios da fé. Os símbolos também são um modo de ensinar, afinal eles também possuem o papel de resplandecer uma mensagem. Enfim, creio que seja um bom modo de iniciar neste mundo tão rico e maravilhoso.

Esta edição foi uma encomenda que fiz com a Old Books, uma empresa com o objetivo de imprimir livros raros a partir de um pdf, caso algum leitor sinta interesse em conhecer este trabalho.

Obrigada pela visita. ♡

A fascinante lista de listas

O problema da ordem é um problema fundamental na vida do homem. No universo, cada coisa está no seu lugar; tudo se encaixa na ordem imutável das leis cósmicas.” – Jacques Leclercq.

As listas são um grande fascíno para mim. Elas me dão a sensação de pôr ordem no emaranhado de objetos que permeiam a minha imaginação. Além da ordem, agrada-me pesquisar se alguém que admiro também criou alguma lista… Bem, como este blog é repleto de leituras, acho que seria perfeito compartilhar minhas listas favoritas destas pessoas que utilizaram critérios e possuem autoridade. Também irei compartilhar a minha listinha, embora eu não seja nenhuma autoridade, mas quem sabe vale pela simples curiosidade em conhecer algo que recomendo…

Os itens marcados com um “✓” são os que eu já li e marcados com um “♡” são os que moram em meu coração!

Para começar, a lista dos 50 livros recomendados pelo Hayao Miyazaki:

  • ✓♡ O Pequeno Príncipe – Antoine de Saint-Exupéry (1943)
  • Il Romanzo di Cipollino – Gianni Rodari (1956)
  • The Rose and the Ring – William Makepeace Thackeray (1854)
  • The Little Bookroom – Eleanor Farjeon (1955)
  • ✓ Os Três Mosqueteiros – Alexandre Dumas (1844)
  • ✓♡ O Jardim Secreto – Frances Eliza Hodgson Burnett (1909)
  • O Tesouro dos Nibelungos – G. Schalk (1953)
  • ✓ Alice no País das Maravilhas – Lewis Carroll (1865)
  • As Aventuras de Sherlock Holmes – Arthur Ignatius Conan Doyle (1891)
  • A Norwegian Farm – Marie Hamsun (1933)
  • Konek-Gorbunok – Pyotr Pavlovich Yershov (1834)
  • Souvenirs entomologiques – Jean-Henri Casimir Fabre (1879-1907)
  • Toui Mukashi no Fushigina Hanashi-Nihon Reiiki – Tsutomu Minakami (1995)
  • Ivan, o Tolo – Liev Tolstói (1885)
  • Eagle of the Ninth – Rosemary Sutcliff (1954)
  • ✓♡ O Ursinho Pooh – A. A. Milne (1926)
  • Les Princes du Vent – Michel-Aime Baudouy (1956)
  • When Marnie Was There – Joan G Robinson (1967)
    O Longo Inverno – Laura Ingalls Wilder (1940)
  • ✓♡ O Vento nos Salgueiros – Kenneth Grahame (1908)
  • The Ship That Flew – Hilda Lewis (1939)
  • Flambards – Kathleen Wendy Peyton (1967)
  • O Jardim da Meia-Noite – Ann Philippa Pearce (1958)
  • As Aventuras de Tom Sawyer – Mark Twain (1876)
  • Chumon no Ooi Ryouriten – Kenji Miyazawa (1924)
  • ✓♡ Heidi – Johanna Spyri (1888)
  • ✓ 20.000 Léguas Submarinas – Jules Verne (1870)
  • Os Pequeninos Borrowers – Mary Norton (1952)
  • Devatero pohádeky – Karel Capek (1931)
  • Swallows and Amazons – Arthur Ransome (1930)
  • The Flying Classroom – Erich Kästner (1933)
  • Robinson Crusoe – Daniel Defoe (1719)
  • A Ilha do Tesouro – Robert Louis Stevenson (1883)
  • The Twelve Months – Samuil Marshak (1943)
  • ✓ O Menino do Dedo Verde – Maurice Druon (1957)
  • The man who planted the welsh onions – Kim Soun (1953)
  • Strange Stories from a Chinese Studio – Pu Songling (1740)
  • The Voyages of Doctor Dolittle – Hugh John Lofting (1922)
  • Jornada ao Oeste – Wu Cheng’en (1500)
  • O Pequeno Lorde – Frances Eliza Hodgson Burnett (1886)
  • From the Mixed-Up Files of Mrs. Basil E. Frankweiler – Elaine Lobl Konigsburg (1968)
  • Alla vi barn i Bullerbyn – Astrid Lindgren (1947)
  • ✓♡ O Hobbit – J. R. R. Tolkien (1937)
  • O Feiticeiro de Terramar – Ursula K. Le Guin (1968)
  • O Cavalinho Branco – Elizabeth Goudge (1946)
  • Bylo nas pet – Karel Polacek (1969)
  • City Neighbor: The Story of Jane Addams – Clara Ingram Judson (1951)
  • The Radium Woman – Eleanor Doorly (1939)
  • O Incidente de Otterbury – Cecil Day-Lewis (1948)
  • Hans Brinker ou Os Patins de Prata – Mary Mapes Dodge (1865)

Agora a listinha que fiz:

  • Fábulas – La Fontaine (1668)
  • Beleza Negra – Anna Sewell (1877)
  • O Hobbit e O Senhor dos Anéis – J. R. R. Tolkien (1937; 1954)
  • As Crônicas de Nárnia – C. S. Lewis (1950 – 1956)
  • Contos de Fadas – Hans Christian Andersen (1835)
  • The Last Unicorn – Peter S. Beagle (1968)
  • Virtude Selvagem – M. K. Rawlings (1938)
  • A Princesa Prometida – William Goldman (1973)
  • Em Busca de Watership Down – Richard Adams (1972)
  • Bambi – Felix Salten (1923)
  • A Teia de Charlotte – E. B. White (1952)
  • Mulherzinhas – Louisa May Alcott (1868)
  • Ivanhoé – Walter Scott (1819)
  • Contos – Oscar Wilde (1888 – 1891)
  • A Princesa e o Goblin – George McDonald (1872)
  • Livros Coloridos das Fadas – Andrew Lang (1889 – 1910)
  • O Quebra-Nozes – E.T.A. Hoffman (1816)

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Odisseia – Homero

“Musa, reconta-me os feitos do herói astucioso que muito peregrinou, dês que esfez as muralhas sagradas de Troia”

A Odisseia conta a história de Odisseu tentando voltar para sua pátria após a guerra de Troia. Embora Odisseu não seja perfeito, ele é o herói de sua própria história. Ele possui muitas virtudes, é corajoso, sábio, assertivo… Mas é por causa de seu orgulho, o que enfurece Poseidon, que a sua tão estimada volta é repleta de dificuldades.

Para melhor compreender o texto, é preciso ter em conta os dois tipos de narrativa que ocorrem: a primeira se passa na Ilha de Ítaca, enquanto a segunda conta todas as aventuras do herói. No começo, há a invocação da Musa para narrar as aventuras. Em outro momento é o próprio Odisseu que está contando o que lhe aconteceu para outros personagens que surgem no decorrer da história. Outras vezes os acontecimentos estão sendo descritos no tempo presente e, por fim, é narrado pelos mortos lá no Hades.

Outro fator importante que o leitor precisa saber é que o poema não é contado de maneira cronológica e os principais pontos são o retorno do herói a Ítaca, a derrota de seus inimigos e a fidelidade de Penélope. Então sabendo disto, não haverá tanta dificuldade em compreender o texto.

Adicionando uma opinião minha sobre do que se trata este poema épico: eu diria que a Odisseia também é, lá no íntimo, sobre os deuses se aproveitando dos infortúnios (ou os provocando) humanos para alcançarem o seu maior objetivo: sacrifícios, mortes, derramamento de sangue etc. A própria Atena comenta que está muito ávida pela justiça (ou vingança) que Odisseu fará quando chegar em casa.

Existem muitos assuntos que são apresentados na Odisseia que podem ser pensados. Sobre o livre arbítrio, os deuses manipulando as ações humanas (igualmente em Troia); os costumes daquele tempo, como os estrangeiros eram sempre muito bem tratados; a glória e a honra, que até mesmo a vingança é vista como algo virtuoso para os gregos.

Voltando para o centro da história, é notório que o coração de Odisseu é movido pelo “nostos”. Na literatura grega, este termo é utilizado para caracterizar um regresso épico de algum herói através do mar. Esta palavra também é usada para designar o processo que um herói vive após a batalha para se tornar marido e pai. O Odisseu quer resgatar isto para a sua vida quando ele ainda não havia partido para Troia.

O principal conflito encontrado é este “nostos” e as forças independentes: Poseidon, Éolo, a ninfa Calipso etc, que dificultam este regresso. Não há extamente um impedimento, pois o Odisseu foi um dos poucos heróis que não cometaram ultrajes contra os troianos, então esta sua virtude, a da misericórdia, lhe proporcionou ter uma fagulha de esperança para voltar para casa e sua família. “Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão miseri­córdia!” (São Mateus, 5:7). Odisseu também se preocupava em salvar a vida de seus companheiros, porém estes pereceram por culpa das próprias ações insensatas.

Nesta leitura também observei alguns símbolos que são mencionados. Acredito que o mais notório é o da águia. Para os gregos, esta ave representa Zeus, elas são enviadas para simbolizar o combate. Isto acontece no começo do livro quando duas águias se matam; em outro momento Penélope sonha com uma águia matando um ganso; e no final, surge uma águia voando com uma andorinha. Estes símbolos diziam que Zeus estava do lado de Odisseu. O mar simbolizando a dinâmica da vida, pois este pode ser calmo e tempestuoso em diferentes momentos. O cachorro Argos simbolizando a fidelidade de toda a família e a maioria dos servos para com Odisseu.

Minhas cenas favoritas são as seguintes: Penélope costurando de dia e desfazendo a manta de noite para ganhar tempo e não ser obrigada a se casar com algum dos pretendentes. Telêmaco não considerando ser capaz de tomar a liderança, mas ainda assim buscando coragem para sê-lo. Este momento me lembrou muito de Moisés! Gosto muito também quando Odisseu é reconhecido pelo seu cachorro, que já estava bem velhinho e maltratado. Amo muito o encontro do herói com a sua mulher e ela lhe testando para ter certeza se ele era mesmo o Odisseu. Eles formam um casal muito lindo! Por fim, a descida dos pretendentes ao Hades e estes narrando como foi o encontro do herói com o seu pai. Muito emocionante este reencontro!

Acredito que estas são as minhas principais considerações da leitura. Lembrando que eu tenho uma lista de desejo na Amazon, caso algum leitor do blog queira me enviar algum livro para ser falado futuramente por aqui e também se quiser adquirir este livro em uma edição diferente, mas com a mesma tradução e me ajudar a ganhar alguma comissão. Muito obrigada e até breve, se Deus quiser!

Obrigada pela visita. ♡

Ilíada – Homero

“Pois, muito embora refreie os impulsos da cólera um dia, continuamente revolve no peito o rancor incontido”

A Ilíada é um poema épico, atribuído a Homero. É considerada a primeira obra literária do ocidente e que até hoje nenhuma outra conseguiu superá-la. Foi uma história conhecida através da tradição oral, só muito tempo depois foi passada para a forma de poema. Segundo Frederico Lourenço, foi no século VII a.C. que a Ilíada surgiu em poema através de Homero.

O debate acadêmico sobre a origem da Ilíada gira em torno da autoria, mas muitos estudiosos concordam que no início ela foi uma tradição oral e muito tempo após se tornou escrita. Crê que no século VI a.C., uma família da aristocracia ateniense providenciou uma edição oficial da obra em livro. Alguns séculos depois, Aristóteles fez uma nova edição, e esta foi lida por seu aluno mais famoso: Alexandre.

A Ilíada narra uma pequena parte da guerra de Troia, dando ênfase a cólera de Aquiles. “Canta-me a Cólera…”, é a primeira frase do Canto I do texto. Portanto, não temos no texto a história de Páris, a disputa das deusas para saber quem é a mais bela etc. Recomendo os livros do Menelaos Stephanides para ter uma compreensão maior de todo o enredo. A professora Elizabeth Vandiver fez um enredo básico como guia de estudo e acho que vale a pena copiar e colar aqui para quem se interessar:

  1. A mulher mais bonita do mundo, Helena, filha do grande deus Zeus e esposa do grego Menelau, foi raptada pelo príncipe troiano Páris.
  2. Sob o comando do irmão mais velho de Menelau, Agamenon, os gregos reuniram um exército para ir a Tróia e lutar pelo retorno de Helena.
  3. A guerra contra Tróia durou dez anos. A luta foi bastante equilibrada, com cada lado tendo seu guerreiro principal (Aquiles para os gregos, Heitor para os troianos).
  4. Aquiles era filho de uma mãe deusa, Tétis, e de um pai humano, Peleu. O casamento deles foi arranjado por Zeus, e Tétis não estava totalmente disposta.
  5. O maior guerreiro troiano, Heitor, foi morto pelo maior guerreiro grego, Aquiles, que foi morto por Paris.
  6. Finalmente, os gregos recorreram à malandragem. Usando o famoso ardil do Cavalo de Tróia, inventado por Ulisses, eles se infiltraram na cidade murada de Tróia e a saquearam à noite.
  7. Os gregos cometeram muitos ultrajes contra os troianos durante o Saque de Tróia. O mais importante deles foi o assassinato do rei Príamo no altar de sua casa, o assassinato do filho bebê de Heitor, Astyanax, jogando-o das muralhas da cidade e o estupro da filha de Príamo, Cassandra, no templo da deusa virgem Atena.
  8. Esses ultrajes enfureceram os deuses, levando a muitas dificuldades para os gregos sobreviventes em seu caminho para casa. Mais importante ainda, Agamenon foi morto por sua esposa e seu amante quando chegou em casa, e Odisseu passou dez anos vagando a caminho de Tróia.

A Ilíada narra o último ano da guerra e termina até a morte do herói Heitor. O ciclo épico de Homero é narrado em outros textos, mas estes foram perdidos, infelizmente, principalmente na época dos bárbaros que quando saqueavam as cidades, destruíam tudo o que viam pela frente, inclusive as bibliotecas. Então só temos o conhecimento da Ilíada e da Odisseia. Os livros completos são: 1- Cíprias; 2- Ilíada; 3- Etiópida; 4- Pequena Ilíada; 5- Iliu Persis; 6- Nostoi; 7- Odisseia; 8- Telegonia.

Para mim, esta leitura trouxe-me vários pensamentos e reflexões. Como se trata de um texto de milhares de anos atrás, tive que levar a minha mente também para esta época para conseguir compreender. Afinal, é um tremendo erro pôr o pensamento da atualidade para um tempo de tantos anos atrás. Fazer isto tiraria a verdade e seria até desonesto. Muitas coisas despertaram o meu interesse, o comportamento dos deuses, a moral da época e o coração do homem. Eu tentarei elaborar o meu raciocínio por aqui.

O mundo antigo era muito mais brutal se comparado com o nosso. Não existia este conceito da guerra ser algo horripilante e de que os homens se recusariam e a evitaram a todo custo, seria um absurdo pensar desta maneira. Na Grécia, era esperado que todos os homens livres lutassem. O seu sistema militar era extremamente disciplinar e o treinamento ocorria constantemente. Temos acesso de que o próprio Sócrates se orgulhava de seu serviço militar, opondo-se aos persas na batalha. A escravidão também era algo corriqueiro e os escravos eram obtidos nas batalhas, guerras. O oponente que perdia, era capturado como escravo. Os homens, mulheres e crianças eram escravizados e as mulheres jovens eram forçadas a serem concubinas.

Outra diferença que é bastante notória, são os deuses. Eles não se assemelham em nada com o Deus onipresente e onisciente, que se importa com os assuntos humanos, que é misericordioso etc. Os deuses do Olimpo se diferem dos homens apenas por serem imortais. Eles se interessam pelos homens, desde que estes sejam poderosos, reis, grandes guerreiros. Quando se trata de um simples camponês não dão tanta importância, mas estes sempre oferecem sacrifícios para “aplacar a ira dos deuses”. Na Ilíada, os deuses às vezes participam da guerra, disfarçados, para ajudarem os seus favoritos. Mas eles não fazem isso por sentirem alguma compaixão ou qualquer outro tipo de sentimento. Eles agem pelo caos, o caos pelo caos.

Bem, neste momento a leitura se tornou também como uma visão espiritual. Os deuses nada mais são os anjos que decidiram não servir mais a Deus, e sim a Satanás. Os heróis, pelo menos alguns, são os gigantes. “Naquele tempo viviam gigantes na terra, como também daí por diante, quando os filhos de Deus se uniram às filhas dos homens e elas geravam filhos. Estes são os heróis, tão afamados dos tempos antigos“. (Gênesis 6, 4). E é muito incrível que os deuses se assemelham bastante aos demônios: o caos pelo caos; imortais; podem se fazer passar por qualquer coisa ou pessoa; influenciam os homens etc. Mas este assunto é muito vasto e merece uma outra publicação…

É possível extrair também conceitos morais do texto, como a virtude, a honra e a glória. A Ilíada para a cultura helênica era como a Bíblia para os cristãos. Segundo Werner Jaeger, o conceito de “areté” é o tema essencial da história da formação grega. O significado mais próximo para esta palavra é “virtude”, mas não no conceito moral que temos, e sim como expressão “do mais alto ideal cavaleiresco unido a uma conduta cortês e distinta e ao heroísmo guerreiro”. Como mencionei no começo, a Ilíada é sobre a cólera de Aquiles. Por que ele está furioso? Porque Agamémnone roubou a sua concubina e isso era uma verdadeira humilhação e desonra. A virtude para os gregos está ligada a nobreza e a força física. Jaeger também diz que a honra está intimamente ligado a “areté” e o homem só recebe honra na mesma proporção que a sociedade a que pertence reconhece o seu valor. Se um homem nobre tivesse a sua honra negada ou ultrajada, seria a maior tragédia que poderia lhe ocorrer. Esta honra atinge o seu ápice com a morte física do guerreiro.

Esse conceito de honra era algo muito importante. Assim é possível compreender a fúria de Aquiles, o seu conflito com Agamémnone e porquê não aceitou, a princípio, os incontáveis presentes deste para reparar o ultraje feito, e também a sua indignação contra os gregos que o fez sair da batalha junto com os mirmidões. A “aretê” era tão essencial que a ofensa também se voltava contra quem ofendeu porque quem feria a virtude de alguém, também tinha a sua própria ofendida.

O coração do homem também é algo que chama a atenção. O que mais me marcou foi o Canto VI, o qual ocorre o encontro de Heitor com Andrômaca. Até desenhei um coração no livro de tanto que tocou o meu coração este momento. Quando o herói vê o seu filho, ele sorrir. Esta simples ação é algo que me faz pensar que apesar da guerra ou época, algumas coisas são intrínsecas ao ser humano, como ver o seu filhinho e simplesmente sorrir. O medo de Andrómaca de que o seu marido morra também é algo tão humano e a resposta de Heitor nos lembra de como era o pensamento daquela época em que os troianos se assemelham aos gregos, pois ele também anseia pela glória imortal.

A Ilíada também deu-me vontade de rir em muitos momentos. Acredito que vale a pena sim se aventurar nestas obras da antiguidade, pois há tanto o que ser dito e pensar! Espero que tenham gostado desta pequena explanação e sintam vontade de lê-la, caso ainda não tenham feito. E quem já leu, que sinta vontade de reler porque releituras são sempre maravilhosas! Ah, e agora se você ainda não possui o livro físico e deseja adquirir, faz isto com o meu link? A tradução é a mesma desta edição de bolso da foto, que é do Carlos Alberto Nunes. Lista do Bosque do Robin.

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